Parte I
Descrença e deslumbramento
Uma analogia entre “Comrades of Time” de Boris Groys, E-Flux
Journal #11 e um percurso — breve auto-análise numa busca da felicidade.
Chegada a exactamente meio daquilo que poderá ser a vida enquanto produtiva, dou conta de que o deslumbramento já não existe muito (em mim). As pessoas, os acontecimentos, os lugares perderam, de certa forma, o encanto. No entanto, há uma coisa que sai deste meu caminho de vivência-desesperançada numa quase incorporação de Meursault (1): as imagens. Não é tanto uma questão de deslumbramento, é mais uma questão de emoção. As composições de linhas, de manchas, de cores ou de corpos em movimento, estruturado e livre são emocionantes. As imagens têm a capacidade de (me) causar sensações e constitui esta razão um possível ponto de partida para algo novo, que é o projecto "Partitura-Poema".
Poderemos eventualmente admitir a ideia de que a linguagem não consegue transmitir o mundo e que ele tem de ser compreendido à luz de novos códigos, dando aqui lugar ao começo da imagética, a mágica transcendental que a nossa mente produz.
Na vontade de conseguir entender o que há na existência da imagem de tão fascinante, confronto-me com questões de como nasce e para quê, o que cria com a sua existência: algo concreto e prático? Algo útil? Emoções? Não serão as emoções o motor da nossa existência? Pode-se questionar o percurso linear da história criando uma visão transformada do presente, do passado e do futuro num contexto existencial em que as probabilidades de cada momento é que o configuram.
“Quem afirma que a hora de dedicar-se à filosofia ainda não chegou, ou que ela já passou, é como se dissesse que ainda não chegou ou que já passou a hora de ser feliz”.
“Todo o bem e todo o mal residem nas sensações, e a morte é justamente a privação das sensações.”
Epicuro, Carta sobre a felicidade (a Meneceu)
O texto “Comrades of Time” de Boris Groys (2), no que diz respeito à questão do tempo, acaba por ser o ponto de partida deste texto, com a ideia de que hoje estamos presos ao presente, pois ele reproduz-se sem levar a nenhum futuro, e a perda da perspectiva histórica infinita gera o fenómeno do tempo improdutivo e perdido.
Pode-se questionar o percurso linear da história criando uma visão transformada do presente, do passado e do futuro num contexto existencial em que as probabilidades de cada momento é que o configuram.
Aristóteles defende que há três formas principais de viver a vida: dedicada ao prazer e fruição, dedicada à acção política, e dedicada à atividade contemplativa. (3)
Gerou-se (gerei?) um ciclo de repetição contínua de um certo estado profissional (e , por consequência, pessoal) que me remete para estas afirmações de Groys, na medida em que vou praticando uma (instituida) Vita Activa em detrimento de uma Vita Contemplativa, numa “inércia inquieta” (4) e onde não me dedico nem ao prazer e nem à actividade política... Groys argumenta que o presente não deixa de estar invariavelmente corrompido pelo passado e pelo futuro. O presente, nesta formulação, é apenas algo que temos que superar o mais rápido possível no caminho para o futuro. O presente é um conjunto de decisões que são adiadas ou reconsideradas para um futuro (hipotético) impedindo a transição suave do passado para o futuro (co)rompendo deste modo a nossa realização de projectos quotidianos menos oportunos, menos elevados ou mesmo impossíveis de realizar. E é aqui que me questiono: que futuro é este que estou a criar? Escolhi-o ou apenas consenti ir realizando tarefas, enquanto adio perpetuamente os meus projectos e objectivos mais íntimos de crescimento pessoal?

Concordo com a visão de Groys de que o presente é, portanto, um obstrutor de nós próprios e das nossas acções, ao baixar as nossas expectativas no aqui-e-agora, mas que quando começamos a questionar os nossos projectos, a duvidar ou reformulá-los, o presente, o contemporâneo, torna-se importante para nós. Isto porque o contemporâneo é, na verdade, constituído pela dúvida, pela hesitação, pela incerteza, pela indecisão - pela necessidade de uma reflexão prolongada, de um atraso.
Segundo Descartes o presente é definido como tempo de dúvida na esperança de abrir um futuro claro (potencialmente desilusório), que queremos prolongar de forma a termos mais tempo para analisar e reflectir. Há assim um período de adiamento infinito: uma suspensão do tempo.
No pensamento pré-histórico o tempo e o espaço coexistiam sem que deles se tivesse consciência prévia. Com a invenção da escrita, da matemática, etc., a humanidade desenvolveu uma forma de pensar sistémica, metódica, estrutural. Se imaginarmos o pensamento com estas formas de pensar estruturais em processo linear e sequencial, nada acontece porque estamos no domínio da causa- efeito, nada acontece sem uma causa. (5)
Se, por outro lado, imaginarmos o pensamento sem estas estruturas prévias ele será caótico, repetitivo - o caos tende à repetição: tudo acontece e tudo está a acontecer. No momento do caos, é então necessário tempo para a reflexão e a estrutura acontecerem e darem um lugar às coisas. Assim, se este atraso, ou suspensão, é necessário, porque lhe associamos uma carga negativa?
Estarei a viver o presente? Encontro-me suspensa num tempo que não reconheço, mas que criei para mim própria, o que me leva, por um lado, a concordar com Groys sobre a sua importância, mas por outro lado, a questionar Bataille quando diz que a repetição é algo natural. Todavia, será natural uma repetição perpétua ou o natural tem um limite? Se o presente é a transição do passado para o futuro, estaremos presos no presente através da repetição e da perpetuação de um adiamento que nos mantém reféns no nosso tempo, desconectando-nos do passado e não nos levando a qualquer futuro? Será este marasmo impossibilitador ou (co)rompedor de um futuro? (ver fig. 1)​​​​​​​

Fig. 1

O que me leva também a questionar sobre a existência de passado, presente e futuro. Será o presente uma consequência do passado, ou uma preparação para o futuro? Se à partida faz sentido que apenas exista o presente, pois o passado já aconteceu e não existe mais, e o futuro é algo que ainda não aconteceu e que apenas projectamos hipoteticamente (ver fig. 2); em contrapartida, qual é a duração do presente? Será que aquilo que existe não é apenas o passado e o futuro, e presente é apenas o nome dado ao final de um, que é o começo do outro? (ver fig. 3).

Fig. 2

Fig. 3

Tudo isto me conduz à ideia de só existir passado: existirá presente, efectivamente? O futuro não passa de projecções, especulações, expectativas. Já o passado é um tempo concreto, sustentado pelas memórias e por factos. (ver fig. 4)

Fig. 4

Qual será, então, o momento - e a condição (falarei disto de seguida) para que alcancemos este futuro que se diz promissor (e que potencialmente poderá ser uma desilusão, considerando que exista)? Significará esse futuro uma possível felicidade, ou será apenas um outro presente, repetido de passado, mas que acontece mais à frente, e mais, e mais?
Foucault alivia um pouco esta questão do tempo repetido dizendo que quando o produto final é realizado, o tempo que foi usado para a sua produção desaparece, porque, entretanto, o tempo perdido na realização do projecto foi (será) compensado na modernidade (ou no futuro) por uma narrativa histórica que de alguma forma o restaurou, glorificando a vida de quem trabalhou pelo futuro. O que quer dizer que existe a condição de sucesso para o tempo não ser dado como “perdido”. Mas e quando o resultado realizado não é alcançado? Aquilo que se poderia transformar em história fica reduzido a apenas tempo perdido? Perde a sua existência por não se transformar em algo, vazio de história e de propósito? Significará isto que o futuro não existe a não ser que haja um desfecho satisfatório, e por isso condenado a ser presente ad-eternum? Estará o homem comum e mediano condenado ao presente?
Se o mundo é uma sequência temporal, a vida é estruturada em memórias sequenciais que pretendem ser a última - o presente - a mais qualificada, a melhor (6), mas é a história um progresso linear?
Voltando a Aristóteles, e sobre o modo como nos entregamos aos nossos projectos e a este caminho sequencial, ele tinha a convicção de que “a excelência é uma acção voluntária” (7), e que a felicidade no sentido de “o melhor de tudo”, “o mais qualificado”, poderá ser o propósito específico do Homem. Por outras palavras, a felicidade reside no exercício de uma certa actividade de acordo com a excelência e a virtude. (...) “A sua existência não precisa de mais nenhuma forma de prazer como ornamento, pois tem o prazer em si própria” (8). Não posso discordar desta visão, mas isto significa que a felicidade pode acontecer se existir brio em tudo o que fazemos: será isso possível? Será possível ser sempre excelente? E será que a excelência leva sempre a resultados positivos? Novamente: estará o homem mediano condenado ao presente?
É a história mais importante que o indivíduo, ou a ideia oposta, do indivíduo associado à sua corporeidade e consciência? O tempo pode ter a dimensão da consciência pois tudo o que pensamos - agora - vem com memórias e protensões (9). Nós somos um Eu temporal e ao longo do tempo, vamos sendo esse mesmo.
Não será a própria experiência, (bem) sucedida ou não, valiosa? Ou mais ainda: base fulcral da nossa identidade. Todo o caminho deveria ser pertinente, e a felicidade deveria estar nele e não num hipotético futuro, caso contrário, temo que tal felicidade possa ser uma utopia.
Se o fizermos há uma visão transformadora do presente, do passado e do futuro num contexto existencial em que as virtualidades (probabilidades) de cada momento é que o configuram.
O tempo entra como um factor constitutivo daquilo que é ser uma pessoa, e não podemos dizer que o mundo sem nós possa ser temporal e espacial, mas connosco ele é assim, porque, antes de mais, percebemos aquilo de que somos conscientes, sempre espacializado e temporalizado.
Se somos uma máquina comportamental que se desenvolveu de determinada forma e num determinado caminho, mas podia ter desenvolvido noutro, o mundo poderia ter sido outro.
Sendo assim, o que é continuar? Se a identidade (que somos e que criamos permanentemente), que é uma ordem mental destacada, mas inerente ao corpo, é temporal, o que é continuar?
A verdadeira felicidade consiste na virtude. (...) Aquele que tenha atingido um plano superior, elevando-se ao máximo, leva algemas frouxas. Não se encontra ainda livre, mas já prevê a futura liberdade.”
Sêneca, “Da tranquilidade da alma”
A questão reside na crença deste caminho que estou a tentar romper, hoje, criando um novo agora, sustentado pela minha experiência passada, na expectativa de um futuro (como motor do presente?), mais contemplativo e ao mesmo tempo, produtivo, onde seja restituída a emoção e o deslumbramento.
“O mais nobre é a justiça e o mais desejável a saúde; / mas o que de mais doce há é encontrar o que se ama.”
Delos (10)
Parte II
A variabilidade da palavra no gesto,
ou o caminho da palavra que se torna corpo e do corpo que se torna imagem.
O texto escrito e a tipografia proliferaram nas primeiras décadas do século XX como um aspecto essencial e altamente visível da arte moderna. Como se sabe, o texto não é novo na arte e na vanguarda, assim como a tipografia. Com o pós-modernismo, os artistas passaram a usar a tipografia nas suas expressões pessoais como uma estratégia de arte pós-moderna e, como resultado, a tipografia tornou-se uma forma híbrida de avaliar as práticas artísticas do século XXI e também uma razão de ser para transmitir ideia, pensamento e mensagem.
A poesia concreta nasce como um rompimento criativo com a comunicação institucionalizada no campo da literatura e das artes plásticas, e cresce na necessidade de diferenciar poesia e poema. A poesia era encarada como um conceito abstracto, mas o poema, por sua vez, era dignificado pelo seu carácter material, tátil, manipulável. Foi ampliado ao ponto de se tornar objecto, com diferentes materializações: poema-objecto, poema-performance, poema-visual, poema-happening, vídeo-poema, ... Num desdobramento multi-direccional, com a visão de uma realidade em processo, e da despersonalização da própria obra. Inúmeros artistas abraçaram a “liberdade de experimentação” com obras orgânicas e nas quais usavam o corpo, que passava a ser o objecto da obra, que comunica, exprimindo-se, relacionando-se. Manifestações performativas que transcrevem e transmitem a materialidade da palavra no gesto, apresentando um ponto de vista mimético das ações, e transpondo para “palco” a realidade do seu pensamento.
“(...) O movimento é o aspecto visível através do qual nos expressamos. O seu carácter depende da fonte que o produz. A forma é inevitável, mas somos nós que a fazemos nascer; (...) e só é visível se lhe dermos consistência. (...) As experiências externas são úteis apenas se não as experimentamos mais como externas.” (11)
Contemporaneamente, o movimento Fluxus expandia-se e procurava exprimir uma ideia de ciclo e de perpetuação da atividade artística.
Dick Higgins afirmava que
o processo de construção da obra é uma construção de si próprio, num espaço cada vez mais aberto a possíveis relações. 
Privilegiavam os happenings numa fusão de arte, dança e teatro concebidas para uma audiência pública ou privada, as performances interativas onde o público era convidado a participar, o vídeo, a poesia e os objets-trouvés - ou readymades, declarando uma abertura para novas possibilidades de pensar o que é a arte, direcionando o retorno a uma dimensão prático-existencial da criação fora de qualquer domínio restrito.
Este movimento negou as barreiras entre os distintos campos artísticos, procurando desencadear e potenciar a criatividade humana, e a intenção de negar o objeto artístico e combater a arte como mercadoria.
Assim, a poesia concreta ou visual surge inundada pelos movimentos de vanguarda que surgiram no século XX (Cubismo, Futurismo, Dadaísmo, Der Stijl, Bauhaus e Construtivismo), dentro de uma nova vaga de movimentos paralelos que criaram espaço para a experimentação artística nas vertentes mais variadas, como a literatura, a performance, a música, e as artes visuais. Assistimos à ebulição das artes que vai de encontro às manifestações artísticas transversais da poesia, da dança, da música, nos seus gestos, nos movimentos, no abstracionismo. Há, nelas, um entrelaçamento dos meios de expressão artística da palavra escrita, da palavra falada, do movimento, do som.
O concretismo foi ainda influenciado pelo construtivismo, no uso da cor como elemento pictórico, no valor descritivo da linha, na ausência do figurativo. Curiosamente, podemos traçar semelhanças entre o quadro “Quadrado negro sobre fundo branco” (1915) de Malevich (ver fig. 5), com a obra “Numéricos”, poema visual impresso em cores (1960-1961), de Wlademir Dias-Pino (ver fig. 6), explorando a relação entre números e palavras e seus infinitos arranjos e possibilidades.
Posso deduzir que, em ambos, o principal objectivo pudesse eventualmente ser a ideia de contemplação inerente a este (e qualquer) objecto artístico, limpo ao extremo de figurações, e no qual o leitor pode fazer a sua própria representação daquele espaço habitado, um universo pictórico e interpretativo, ou tipográfico, no caso de Dias-Pino.

Fig. 5. / Fig. 6.

No entanto, a teoria concretista, que renegava o discurso na justaposição de palavras, levava o poema a um nível de abstracção quase total, e à erradicação de qualquer conteúdo, que não a significação das palavras isoladas.
O texto estético ou visual (mais do que literário) foi estruturado num novo espaço poético e transformado num jogo formal, a partir de uma visão simbolista do mundo e da arte, num espaço que alicerçava probabilidades criativas.
À semelhança da profusão dos labirintos barrocos, da ausência de uma estrutura de grelha de Mallarmè ou dos caligramas de Apollinaire, testaram-se os limites e as possibilidades da construção da imagem e da escrita, onde o texto e a geometria se instigavam num jogo entre a leitura e a visualidade, sugerindo novas direcções de interpretação, novos modos de pensar a obra. As obras tornaram-se projectos gráficos e poéticos, que convocavam a reflexão verbal, visual e tátil. Os efeitos estéticos nos planos do conteúdo e da expressão eram o resultado da exploração da materialidade em que o resultado consistia em composições complexas de elementos gráficos que se combinavam. Os elementos formavam um todo cheio de sentido, no qual adquiriam uma relação plástica, poética e tipográfica indivisível e inseparável, de codificações em linguagem verbal e não verbal, que deviam ser praticados no ato da leitura para o seu total entendimento.
O receptor passava de uma condição contemplativa a uma condição participativa, na medida em que se tornou explorador desta multiplicidade de hipóteses construtivas. E a interrogação da arte surge como modo de interrogar a vida, através da interrogação do signo, do objecto e do processo. As palavras apareciam codificadas por meio da associação de estruturas, em que pontos, traços e formas substituíam as letras dos poemas, possibilitando ao espectador uma leitura visual através de gráficos geométricos, e superando-os formalmente.
Este processo integrou uma visão da realidade em processo, onde não há início, fim ou uma sequência estabelecida, e exaltou a obra aberta, que apresenta um campo de possibilidades ilimitadas, desdobramentos, alternativas experimentais, que ganha novas possibilidades criativas e que projecta novas versões dela mesma, com uma natureza rizomática e uma crescente autonomia da própria obra.
“O meu trabalho começa com a escrita - sou um escritor que deriva para as artes visuais através da experimentação com a palavra (...) O meu trabalho também começa com a pintura - sou um pintor que deriva para a literatura através de um processo de consciencialização dos laços que unem todas as artes, particularmente na nossa sociedade.” Ana Hatherly (12)
Ernesto de Mello e Castro escreveu que “é no despertar de nós próprios que a poesia se cria” (Castro, 1993), e esta aventura da construção da obra possui uma força convergente que atrai o espectador, transformando-o em participante, e fazendo da obra um sistema aberto e expansivo, que a projecta para além de si própria. A comunicação é então, a consequência desta força centrífuga projectada ao leitor. Deparamo-nos com as duas faces opostas de uma mesma matéria: a força centrífuga que “agride” o espectador, enquanto a força centrípeta o atrai para a obra: cria-se uma comunicação consigo próprio, através da obra - sobre ela e para além dela. É este o poder de comunicação da obra.
É certo que o modo como vemos e entendemos o que nos rodeia é influenciado pelo que conhecemos, vivemos ou acreditamos: olhar é um acto de escolha e interessamo-nos por algo com o propósito de criar uma relação com esse objecto. O olhar do espectador é sempre uma relação entre ele e os objectos, de modo a que a leitura das coisas é sempre única, pessoal e íntima: é um “olhar a partir de uma infinidade de outros olhares possíveis”. Berger afirmou que “ver vem antes das palavras”, e o mundo de hoje comunica através de uma linguagem feita de imagens. (Berger, 2018)
Este texto nasce e termina com um exercício que pressupõe a continuidade: o acto é que origina a obra. A acção performativa tem esse dom maior da ambiguidade, abrindo-se a várias leituras e significados. A possibilidade da descoberta, aliada à existência de cada um faz com que cada leitura seja única, no seu modo de encontrar um espaço influenciado e preenchido pela experiência pessoal, num determinado espaço-tempo.
Em Little Gidding (1942), T. S. Eliot questiona o tempo, o passado e o futuro, a perspectiva, o começo e o fim. O começo significa abrir um novo capítulo na história de qualquer coisa, e significa iniciar algo que não foi feito antes, algo que tem potencial para influenciar os outros de uma forma ou de outra que pode moldar as culturas, condições culturais ou às vezes idades. (Kozak, 2021)
Interessa desenvolver outro tipo de reflexão e questionar o que mudou, ou não.
O que sabemos uns dos outros e de nós próprios é um lugar cada vez mais turvo, é urgente abrir canais à transformação, à criação de alternativas de pensamento e de intervenção. A justaposição da ideia e da acção, remete-nos à fluidez do tempo. Ainda mais porque o tempo e o espaço formam um contraponto constante, oferecendo uma imagem panorâmica da continuidade humana que seria difícil de conseguir apenas com palavras.
1. Mersault, personagem principal do livro “O estrangeiro”, um romance de 1942 do autor francês Albert Camus.
O personagem-título é Meursault, um colono francês na Argélia, cuja indiferença pela morte da sua mãe demonstra algum distanciamento emocional do seu ambiente. Mersault é uma pessoa sincera, que diz o que pensa sem se importar com os outros, e que está total e invariavelmente afastado da sociedade devido à sua indiferença.
2. “Comrades of Time”, E-Flux Journal #11, 2009, Boris Groys.
3. Aristóteles, “Ética a Nicómaco”, Livro I, pg 25/26, Quetzal Edit. A felicidade como o bem supremo que pode ser obtido através da acção humana (1095 a 18). A felicidade é uma certa actividade da alma de acordo com uma excelência completa (1102 a 5). Estudo das excelências (1102 a 6). Formas de excelência: do carácter do Homem (éticas); do ensamento teórico (dianoéticas) (1103 a 5).
4. Sêneca, “Da tranquilidade da alma”.
5. Referência a Vilem Flusser, sobre a questão do caos. Flusser pesquisou o significado histórico e cultural de formarmos uma colectividade que acredita acima de tudo nas imagens; o seu trabalho foi influenciado pelo existencialismo e focado na filosofia da comunicação e da produção artística, e na dicotomia imagem/ texto.
6. Quando a humanidade começou a perceber o mundo como uma sequência temporal, uma progressão dialética (Hegel, Marx) a vida ficou estruturada em memórias sequenciais que pretendiam ser a última: o presente, a mais qualificada. Mais à frente os chamados filósofos negros (Nietzsche, Kierkgard, Schopenauer,...) começaram a rejeitar a ideia de que a história seja um progresso linear. Nos primeiros a História era mais importante que o indivíduo, nos segundos começa a ideia oposta de que o indivíduo está abandonado à sua corporeidade.
7. Aristóteles, “Ética a Nicómaco”, Livro II, pg. 78, Quetzal Editora.
8. Aristóteles, “Ética a Nicómaco”, Livro I, pg 35/36, Quetzal Editora.
9. (do latim protendere, «estender para a frente») esperanças, expectativas. Husserl e a fenomenologia começam a prestar atenção à consciência íntima do tempo: não há correspondência entre o tempo cósmico, físico, e o tempo da “representação“ das coisas que são pensadas por nós: começa a surgir a impossibilidade do agora, de o fixar. Tudo o que pensamos agora vem com memórias e protensão.
10. Retirado de “Ética a Nicómaco”, Aristóteles, Quetzal Editora.
11. Gret Palucca, citada em Dianne S. Howe, “Individuality and Expression. The Aesthetics of the New German Dance”, 1908- 1936, Nova York, Peter Lang Publishing, Inc., 1996, p.15 de Inglês (EUA) por J.-F. Cornu.
12. In “Auto-Biografia Documental”, Ana Hatherly. Obra Visual, 1960, Fundação Calouste Gulbenkian, Centro de Arte Moderna, 1992, p.75.

Referências bibliográficas:
Aristótles. Ética a Nicómano. Quetzal Editora, 2004.
Berger, John. Modos de Ver. Antígona, 2018.
Camus, Albert. O Estrangeiro. Porto Editora, 2016
Castro, E. M. de Melo e. O caminho do leve. Fundação de Serralves, 2006.
Elliot, T. S. Little Gidding. 1942.
Epicuro. Carta sobre a felicidade (a Meneceu). Fundação Editora da UNESP, 2002. 
Georges Pompidou, Centre national d’art et de culture. Danser sa vie, Art et danse de 1900 à nos jours. 2011.
Groys, Boris. Comrades of Time. E-Flux Journal #11, 2009.
Hatherly, Ana. Território Anagramático. Fundação Carmona e Costa, 2017.
Kozak, Selma. The Beginning of Typographic Installation and Contemporary Graphic Creativity. Papers in Arts and Humanities, 1(1), 56–74. 2021.
in https://doi.org/10.52885/pah.v1i1.43
Nóbrega, Gustavo. Poema processo: uma vanguarda semiológica. Editora WMF Martins Fontes, São Paulo, 2017.
Sêneca. Da Tranquilidade da Alma, precedido de Da Vida Retirada e seguida de Da Felicidade. L&PM Editores, 2009.
https://portal.lygiaclark.org.br/
https://dickhiggins.org/
www.fondazionebonotto.org https://revistarosa.com/1/mallarme-fundador-da-arte-contemporanea

Diagrama de estudo I - PP#V1 + PP#V2

Diagrama de estudo II - PP#V1 + PP#V2

BIO
Joana Pais (1984), com percurso académico e profissional em Design, procurou sempre desenvolver uma vertente mais conceptual nos projectos, e explorá-los de um modo mais abrangente, onde defende uma abordagem na qual cada projecto é analisado pela sua singularidade e pelo seu conteúdo integrante, e relembrando o quão inspiradora pode ser a actividade do designer quando associada a outras áreas artísticas e técnicas. Do seu trabalho dos últimos anos destaca-se a exploração gráfica e cénica e os projectos essencialmente ligados à música e ao espectáculo, que aliados aos quase 20 anos de dança fazem agora parte da sua investigação actual em torno da temática "palavra - poética - corpo", explorando a tipografia, a poesia e o movimento, e o interesse na ocupação do espaço e na materialidade do texto. Licenciatura em Design na Universidade de Aveiro; duplo Master em Design de Produto e Interiores na Scuola Politecnica di Design em Milão, Itália; curso intensivo de Produção Multimedia - Som e Imagem Digital na Alquimia da Cor, Porto; actualmente a fazer doutoramento em Arte Contemporânea no Colégio das Artes da Universidade de Coimbra. 
Destaques : Projecto vencedor LED Competition 2009, Milão; Convite para representação da Scuola Politenica di Design no Salone del Mobile 2011, Itália; Participação no Salone del Mobile 2009, 2010 e 2011, Itália; Participação artística e oradora na conferência da primeira edição do Get Set Art Festival, Porto; Projectos para 3M, Nivea, Whirlpool, Madame Supertrash, Portugal dos Pequenitos, artistas nacionais e internacionais e colaborações com entidades ligadas a festivais e eventos e produção musical, entre outros; Projecto no livro "Grand Stand 4, Design for Trade Fair Stands", Frame Publishers, Amsterdam (NL), 30-31; Referência no livro "Masterclass, product design, Guide to the World's Leading Graduate Schools", Frame Publishers, Amsterdam (NL); Presença em artigos em revistas e jornais: Parq Mag, La Repubblica, Il Sole 24 ore, Casamica. 
Actualmente é professora convidada na Pós-Graduação em Gestão e Produção de Eventos da Católica Business School no Porto, onde leccionará a disciplina de "Branding, comunicação e cenografia", a iniciar em Outubro de 2023, e a desenvolver projectos por conta própria em:  www.paisdafranca.pt / ​​www.paisdafranca.myportfolio.com
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